LUÍSA FERREIRA, A CIÊNCIA CURA. SCIENCE HEALS, 2021

Exposição no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, de 12 de novembro de 2022 a 26 de março de 2023.

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Luísa Ferreira

A Ciência Cura: O conhecimento no combate à Covid-19 em Portugal (março-junho 2020). Science Heals

Fotografia: Luísa Ferreira / Texto: Manuel Heitor, Duarte Azinheira, Helena Pereira, David Santos

Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda / Lisboa: Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior / Maio . 2021  

Português e inglês / 24,7 x 23,1 cm / 192 pp.

Cartonado. Com manga no rosto da capa com fotografia / 500 ex.

ISBN: 9789722728959 

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Editado pouco mais de um ano após o início da pandemia do COVID-19 em Portugal – as medidas de isolamento foram implantadas em meados de março de 2020 – este livro regista a atividade desenvolvida nos 3 meses seguintes: de março a junho de 2020, mais precisamente de 15 de abril a 22 de junho, em diversos laboratórios, centros de estudo e de investigação, além de instituições, relativamente ao “conhecimento no combate à COVID-19”, através da fotografia de Luísa Ferreira, «exemplos particularmente reveladores das potencialidades do envolvimento coletivo de cientistas com entidades públicas e privadas, incluindo as mais variadas empresas industriais, num esforço de mobilização pela ciência, mas sobretudo dando um novo lugar à ciência.», como destaca Manuel Heitor no Prefácio. Manuel Heitor destaca a abrir a obra a homenagem a Maria Sousa, cientista e professora emérita da Universidade do Porto, que faleceu com o coronavirus, e que Luísa Ferreira fotografara em 23 de fevereiro de 2015.

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O livro integra ainda outros dois textos que antecedem as imagens: “Imprensa Nacional – Casa da Moeda ao serviço do conhecimento”, de Duarte Azinheira, Diretor editorial e de cultura da instituição; e da presidente da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Helena Pereira, escreve “Histórias da Ciência em Pandemia”.

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Permito-me transcrever do Prefácio, “A Ciência Cura!”, de Manuel Heitor, Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior:

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As fotografias de Luísa Ferreira foram recolhidas durante a fase inicial da propagação do coronavírus SARS-CoVQ em Portugal, durante os meses de abril a junho de 2020, incluindo o período de confinamento a que todos fomos sujeitos em Portugal, na Europa e no mundo. Refletem, efetivamente, um sentimento de profunda humildade perante a ignorância coletiva em que estamos todos mergulhados a nível global!

A incerteza e o desconhecimento sobre o futuro inundaram as nossas rotinas diárias, não sendo menos verdade admitir que a ocupação exaustiva dessas rotinas com sessões virtuais e o recurso às mais variadas tecnologias digitais não nos deixam o tempo suficiente para refletir sobre donde viemos, onde estamos e para onde queremos ir.

Porque saber lidar com a incerteza, o risco e o desconhecimento sobre o futuro, que o novo coronavírus SARS-CoV-2 tão prontamente nos veio alertar é, de facto, o desígnio de todas as sociedades modernas e o melhor que podemos passar às futuras gerações. Exige aprender mais, com mais solidariedade e debate intergeracional, compreendendo o respeito pelo próximo, independente do seu género, idade, etnia ou orientação sexual.

Aprofundar esta problemática é cada vez mais relevante pois este novo coronavírus passou de animais para humanos e embora esse processo esteja longe de estar conhecido, sabemos que as doenças zoonóticas, ou zoonoses, têm vindo a aumentar devido à pressão que as nossas sociedades e o seu desenvolvimento económico exercem na natureza. E uma clara manifestação da falta de equilíbrio da influência dos seres humanos na Terra, que se expressa também através das alterações climáticas. Ora, a eventual demonstração científica dessas relações com a pandemia com que agora vivemos exige mais conhecimento para conseguirmos fazer perguntas mais certeiras e difíceis e melhor percebermos os riscos que corremos, assim como evoluirmos nesta nova era geológica do Antropoceno.

Como diz o curador David Santos «uma fotografia é sempre um diálogo de comunicação» e, neste caso, as fotografias de Luísa Ferreira são elementos efetivos de comunicação dos processos de fazer ciência e de produzir e difundir o conhecimento no combate ao COVID-19 em Portugal entre abril e junho de 2020. A forma como as fotografias de Luísa Ferreira nos apelam a refletir sobre a nossa própria fragilidade só nos pode estimular a aprofundar o debate sobre evoluir nesta nova era, com mais conhecimento e humanismo, estimulando novas perguntas para a ciência responder e melhor explicando a todos os processos inerentes à prática científica.

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A terminar, após as fotografias de Luísa Ferreira, David Santos, historiador de arte e curador, escreve sob o título “Uma poética do combate”:

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O que as fotografias tornam imediatamente acessível

não é a realidade, são as imagens.

Susan Sontag

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As fotografias de Luísa Ferreira veiculam uma sensibilidade atenta ao pathos da humanidade, que desvela um movimento, uma série de instantâneos captados sem retificação ou hierarquia metodológica, perscrutados apenas por entre as fissuras do real. Trata-se de uma constelação de imagens que, apesar da sua propensa objetividade, não deixam de se refugiar na ideia de fragmento (todas as fotografias o são, em parte), espécie de visões parcelares e autónomas em termos formais relativamente à sua motivação temática original. Como perceções dinâmicas e variáveis, animadas em torno de uma atenção particular a esse teatro de operações comandado pela determinação de uma luta sem tréguas, as imagens desta série sancionam, apesar das contingências e da urgência da sua realização, uma ideia de visualidade poética e semântica, em parte subsumível ao universo da ciência, mas de uma ciência humanizada na fusão estética e transcendental com os seus instrumentos e objetos específicos, como nessa imagem de um braço humano que, ao ser esticado para acender uma luz, parece assumir-se como extensão natural do complexo maquínico e laboratorial que ocupa o plano central da fotografia.

Se a ciência é, a cada dia, sinónimo de crença na cura da enfermidade que avassala o mundo, a arte é visionária e desconcertante no modo como interfere ou contribui para essa imagem, dado que coloca no plano do imaginário os sintomas de uma aliança mágica entre o real e a sua suspensão. Tal como escreveu Susan Sontag: «a câmara atomiza a realidade, torna-a manuseável e opaca. E uma visão do mundo que nega a inter-relação, a continuidade, mas que confere a cada momento as características de um mistério.» 1 A troca de sentidos, afetos e significados que uma fotografia pode harmonizar entre duas pessoas constitui assim uma imagem simbólica do intercâmbio existente entre a ciência que luta agora para dominar o vírus e a arte que procura criar a memória dessa realidade histórica, a sua posteridade sensível, mas complexa. Deste modo, ao enfatizar qualidades e disfunções não disponíveis em outros meios, a arte permite criar dinâmicas de perceção do real que questionam as imagens estereotipadas que nos rodeiam, impondo um dispositivo de reflexão que as inverte e radicaliza a partir das suas contradições, para as renomear por fim enquanto possibilidade de aprofundamento sobre a experiência da vida. O que a série fotográfica de Luísa Ferreira reitera é precisamente esse aspeto de fascinação transversal a qualquer verdadeira prática artística. E se, como nos avisa Marie-José Mondzain, «o invisível, na imagem, é da ordem da palavra» 2, a fotografia parece alertar-nos, desde a sua origem, para a soberania da ilusão expressa pelo real nas suas imagens. A contingência desse exercício, para usar uma reflexão de Hans Belting, é que «a diferença entre imagem e realidade, na qual reside o enigma de uma ausência tornada visível, regressa à fotografia sob a forma da distância temporal em que se apresenta post factum aos nossos olhos.» 3

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1 Susan Sontag, Ensaios sobre Fotografia, (1973), (trad. port. de José Afonso Furtado), Lisboa, Quetzal, 2012, p. 31.

2 Cf. Marie-José Mondzain, L’lmage peut-elle tuer?, Paris, Bayard, Coll. «Le temps d’une question», 2002

3 Hans Belting, op. cit., p. 273.

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Luísa Ferreira, A Ciência Cura. Science Heals, 2021

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“A Ciência Cura” de Luísa Ferreira está em exposição no Museu do Neo-Realismo, na R. Alves Redol,445, em Vila Franca de Xira, de 12 de novembro de 2022 a 26 de março de 2023.

Ao longo da exposição, em diversos sábados da parte da tarde, houve lugar a visitas guiadas e debates.

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António Bracons, Aspetos da exposição, 2023

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A ‘folha de sala’ é um caderno de 16 páginas que reúne os textos de Manuel Heitor e David Santos, além de algumas fotografias.

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Luísa Ferreira, A Ciência Cura, Folha de sala, 2022

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Pode conhecer mais sobre a obra de Luísa Ferreira no FF, aqui.

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