MARIANA CASTRO, NE TOUCHE PAS

Exposição em Setúbal, na Casa da Cultura, de 3 de junho a 24 de setembro de 2023.

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Conheci Mariana Castro e tive oportunidade de ver este seu trabalho, tomando a forma de livro, ainda uma impressão única, maquete. Um projeto pensado, desenvolvido, trabalhado. Entretanto aprofundado. E esta exposição. (E fica a faltar o livro).

Mariana Castro entra no espaço do museu. Ou da coleção. Ou da memória. (E ao ser da memória, também pode ser da fotografia.) Vê as peças. Vê para além das peças. Para além da pintura e da escultura. Questiona a dualidade…

O real e o imaginário. O modelo e a representação. O ser vivo e a peça inerte. O efémero e o eterno. O atual e o imutável. O privado e o público. A ver e sem mexer.

Ne touche pas.

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VER SEM MEXER

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É como se nos deixassem ficar durante uma noite num museu. Modelos saem do escuro.

Despem-se. Experimentam expor-se aos artistas em posições delicadas. Observam. São observados. Os artistas adormeceram. De repente surge alguém. Um guarda? Um visitante mais distraído? Não se percebe. Os corpos despidos circulam. Enleiam-se. Existe entre estas paredes uma nítida apologia da intimidade feminina. A artista que fotografa regista a proteção. O aconchego. O conforto desta nudez tão pura e inquietante. O fascínio que a visualização destes ambientes transmite provoca melancolia. Nostalgia das pinturas e das esculturas de outras vidas? Talvez. Mas surpresa também. Apetece-nos dizer: tocar não se pode. Mas percebemos que a tentação exista. Queremos perceber o que estamos a ver. Agrada-nos esta companhia. Parece que já “lemos” isto em qualquer lado. A Literatura explica tanta coisa que olhamos e que não percebíamos até aí. Estas imagens são metáforas visuais para lermos e refletirmos. Está tudo na Literatura. Esta exposição da Mariana Castro também. E dava um livro. Dos bons.

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José Teófilo Duarte

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NE TOUCHE PAS

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Se a roseira fosse uma pergunta, daria o mote a este livro-exposição. A pergunta é antiga. Brotou na imaginação da fotógrafa desde a infância. Que força é essa que a fragilidade não anula?

As mulheres que povoam estas imagens são personagens-espelho. É nelas que a fotógrafa se reflecte. Encarando o espectador, a sua imagem em forma de Pietá sugere: Ecce femina. Eis a vulnerabilidade, a delicadeza, a languidez, mas também, em contrapartida, a resistência e a ferocidade.

A interdição – ne touche pas – é um convite à desobediência. Pois estas fotografias desejam o toque. Não o toque em geral. Mas declinado em gestos: afagar, acariciar, estirar-se, erguer-se, aconchegar-se.

No fascínio pelo gesto, manifesta-se a afinidade com a escultura. Capta-se o gesto na curva do movimento, entre luz e a sombra, furtivamente.

A fotógrafa espreita como quem caça o momento, através da objectiva como do vidro ou da fechadura.

O momento é efémero, mas é-o também a pedra sujeita à fúria dos séculos, a terra sujeita à fúria dos elementos, o corpo sujeito à fúria das entranhas.

Se a pergunta é a roseira, o espinho – aquilo que fere e arrebata – é o enigma.

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João Pedro Cachopo

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Mariana Castro, Ne Touche Pas

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Mariana Castro, Aspeto da exposição “Ne Touche Pas”, 2023

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António Bracons, Mariana Castro, Aspetos da exposição, 2023

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A exposição de Mariana Castro, “Ne Touche Pas”, com curadoria de José Teófilo Duarte está patente em Setúbal, na Galeria João Paulo Cotrim da Casa da Cultura, na R. Detrás da Guarda, 28, de 3 de junho a 24 de setembro de 2023 (inicialmente até 24 de julho). Finissage: 24 de setembro, 16:00.

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Pode conhecer melhor a obra da autora, aqui e aqui (Instagram).

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Cortesia da Autora.

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