SARA ROCIO, PRENÚNCIO
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Escreve Sara Rocio:
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O projecto é composto por quatro partes, que refletem sobre os quatro elementos: Interlúdio / Nebulosa / Duração / Peso.
Nenhum dos elementos é representado de forma literal, mas simbólica. Embora estejam plasticamente subjacentes, cada parte é independente e interliga-se com as restantes.
Todo o meu processo parte da palavra, a ela está associada a minha forma de formalização do pensamento e da construção das imagens, primeiro mentais, depois fotografadas e intervencionadas.
As imagens são compostas por signos, componentes, elementos gráficos, não são o que vemos, nem duplos das coisas, são as próprias coisas.Neste processo abordo a corporalidade das imagens, as suas fragilidades materiais, e a sua vulnerabilidade à passagem do tempo.
Procuro refletir sobre as interioridades que nos são comuns, e tão particulares ao mesmo tempo.
Proponho, uma reestruturação das proposições sobre o lugar do humano no universo, naquilo que nos é tangível, próximo ou distante.
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Interlúdio _ Transição do tempo sobre os corpos, sobre o meu corpo.
Uma materialidade que transcorre como um rio, que no seu percurso, não se apega às margens, que no seu percurso transforma.
Esta parte, reflecte sobre um período de distensão, onde à semelhança da passagem bíblica do baptismo, se processa uma purificação, uma redenção e um encontro interior.
A água como elemento primordial.
Neste trabalho, há como um corpo iniciático, que parte do ponto zero, com uma brancura acentuada pelos processos sobre as imagens.
Um corpo pronto a rescrever-se.
Um renascimento.
Trata-se de do início do início.
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Nebuloso _ O céu não é o limite.
Quando olhamos para a infinidade do firmamento, nada podemos observar, a não ser a nossa mais íntima limitação do alcançar.
Esta sensação de pequenez perante o gigantesco complexo em perpétuo movimento, inquieta tanto a profundeza do ser, quanto o tão infinitamente incompreensível interior que nos constitui.
O que proponho é uma observação inversa, como se de muito distante estivesse a observar a nossa existência.
O continuo movimento dos nossos corpos que se apagam, assim como tudo no universo, por nada existir para sempre deixa um rasto de espectros.
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Peso _ Da terra nasce, à terra volta.
Numa visão poética entrelaçada com duas forças opostas, a gravidade e a vontade de o superar, onde o impacto não é agilizado pela matéria. A materialidade está subjacente a esta abordagem.
O peso prende-se à relação que se mantém latente entre todos os corpos, que na sua tentativa de sobreviverem exaltam a sua existência por onde passam.
A inevitabilidade do fim, a morte, será o derradeiro estado material, que a terra lentamente consome, como se esta aglutinação fosse a única verdade, e a matéria que nos constitui, voltasse ao estado primordial da composição de tudo.
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Duração _ Da brutalidade ao sublime.
Busco um olhar sobre o enlace dos corpos na intimidade, lugar de exaltação dos sentimentos mais ocultos da alma humana.
Procuro uma leitura possível sobre esta relação, com linguagem própria e irremediavelmente intransmissível.
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António Bracons, Aspetos da exposição, 2022
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“Prenúncio” de Sara Rocio integrou o Mês da Fotografia do Barreiro, exposição patente no Auditório Municipal Augusto Cabrita, 27 de novembro de 2021 a 13 de fevereiro de 2022.
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Sara Rocio. Sobre si, diz:
Nasci no extremo ocidental da Europa, Portugal, três anos antes da revolução dos cravos. Estudei de forma avessa à lógica comum. Primeiro segui o ramo científico, licenciei-me em design, e fiz mestrado em estudos cinematográficos, acabei por descobrir que o meu meio natural são as imagens, paradas ou em movimento.
O que gostaria de ter sido?.. Bailarina.
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Sobre a fotografia, regista:
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Todo o meu trabalho é inconcluso.
Esboços inacabados.
Dificilmente penso na finalização, porque entendo que está tudo ligado – quando eu acabar, ele acabará.
Entretanto, crio ensaios.
Pouco interessa a precisão realista da fotografia, admiro-a e deslumbra-me, porém, procuro o que vejo por dentro e não por fora.
Na brutalidade do erro do meu olhar, e no descontrolo que se instala na imprecisão do meu processo, realizo.
Trabalho com filme, revelo, amplio.
Tudo muito lento.
O tempo não opera a meu favor. Porque a urgência do mundano e da sobrevivência, travam.
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Pode conhecer mais sobre o trabalho de Sara Rocio no site da autora, aqui.
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