JOÃO MOTA DA COSTA, DO OUTRO LADO DO ESPELHO, 2018

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João Mota da Costa

Do outro lado do espelho

Fotografia: João Mota da Costa / Texto: Margarida Medeiros  / Design gráfico: Paula Prates

Lisboa: Edição de Autor / Fevereiro 2018

Português e Inglês / 20,7 x 32,0 cm / 48 págs.

Brochura / 200 ex.

ISBN: 9789892081939

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Joao Mota da Costa-Do Outro Lado do Espelho (1)

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Há pelo menos um ano e meio que João Mota da Costa buscava no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa (CHPL) a concretização de um projeto que mostrasse aspetos da loucura, mas de uma forma diferente, respeitadora e integrada na história da instituição. A maior parte das situações de doença mental ali tratadas, em regime de ambulatório, correspondem a situações de esquizofrenia.

Este projeto surge no âmbito da atividade do Pavilhão 31 do CHPL: “um espaço no qual se promove o desenvolvimento artístico no máximo das suas vertentes, reabilitando mentalidade e apostando numa ação de responsabilidade social direcionada para a doença mental.” Inaugurado em Março de 2012 o “Pavilhão 31 tem desde então aliado artistas consagrados, nacional e internacionalmente – como Pedro Cabrita Reis, Jorge Molder, Souto Moura e Jeff Koons – com o trabalho desenvolvido no ateliê de artes plásticas do CHPL, através de exposições conjuntas.”

Mota da Costa procurou os espaços, a sua história. A sala onde hoje têm lugar as atividades do Ateliê de Artes Plásticas, do programa de recuperação pela arte, é o mesmo onde em tempo funcionou a sala de cirurgia onde eram realizadas as cirurgias de lobotomia pré-frontal, cuja descoberta valeu o Prémio Nobel da Medicina a Egas Moniz. Algum tempo depois, no âmbito da pesquisa e investigação que efetuou, veio a encontrar um espelho, antigo e envelhecido, em parte degradado, mas que tinha uma grelha impressa e que servia para fazer as medições dos pacientes. Uma cadeira existente, onde os pacientes se sentavam e que possui um encosto para a cabeça, ficando esta um pouco para trás, foi outro dos objetos localizados.

Estavam encontrados os elementos chave para este projeto.

Mota da Costa abre e fecha o livro com a imagem da Sala de Cirurgia e do Ateliê de Artes Plásticas, respetivamente. A preto e branco, ocupando cada uma o seu fólio. E também uma imagem, de Arquivo, do Atelier Fotográfico.

Mota da Costa fotografou a imagem no espelho, o reflexo de cada um dos pacientes, sentado na cadeira, devidamente centrada no espelho e, paralelamente, uma peça de cerâmica executada por esse paciente, sobre um plinto, também refletida no espelho. Sempre na sala do Ateliê de Artes Plásticas.

A imagem de cada um dos pacientes e da peça por ele executada, refletida no espelho, captada em posição análoga, com uma câmara técnica, mostra cada um no seu mundo, na sua loucura, como estando “do outro lado do espelho”.

As fotografias aparentam, pois, uma matriz e uma similitude: a moldura em madeira, não é mais que a moldura do espelho fotografada; e o espelho, com as suas marcações e deteriorações, atrás das quais se reflete a imagem de cada paciente e da sua criação.

No livro, opõe-se à imagem da peça criada a imagem do criador, como verso e anverso de uma mesma realidade, como estando cada um: autor e peça, do outro lado do mesmo espelho.

Uma folha branca intercala cada pessoa, para que cada um seja apenas “ele próprio” e não se confunda com mais ninguém. Não se veja mais que ele.

Compõem o livro as fotografias de seis pacientes e das suas obras (ou seis obras e os respetivos autores, de acordo com a sequência de apresentação).

O colete de forças, fica no cabide, não faz falta. É a imagem que abre a exposição.

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O catalogo inclui o texto “A imagem ao espelho – sobre as fotografias de João Mota da Costa” de Margarida Medeiros, escrito especialmente para a obra. Cito uma parte, destacada para a folha de sala:

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“A comparação entre a fotografia e o espelho vem de longe, desde os seus inícios. A questão da verosimilhança por meios técnicos foi central à recepção da fotografia desde as suas origens até hoje; colocou-a semanticamente próxima de qualquer imagem de carácter realista —mas muito para além das potencialidades da pintura, uma técnica manual —, e culturalmente próxima do reflexo especular, a imagem que espontaneamente se gera em superfícies espelhadas (não apenas os vidros-espelho, mas os vidros simples, a água, o metal, etc.). É célebre a expressão de Oliver Wendel Holmes ao referir-se daguerreótipo como «um espelho com memória».

O trabalho de João Mota da Costa aqui apresentado vai no sentido de se demarcar desse automatismo realista que anseia a literalidade, que leva o fotógrafo a reagir directamente com a sua objectiva aos estímulos do mundo, aos seus objectos, ao sabor de um impulso caçador de imagens, que marcou a prática da fotografia de massas ao longo do século XX. Demarcar-se desse registo de fabricação de evidências significa aqui convocar um objecto de pesquisa não representável visualmente de uma forma directa, como a doença mental ou a história do seu tratamento e assumir essa recusa de fotografar a partir das aparências.

Mostrar, mas sem a pretensão de «retratar», parece ser aqui o mote fundamental de JMC. Este jogo entre o mostrar e o esconder parece-me essencial no resultado final do conjunto, a razão pela qual todo o projecto comporta uma dimensão oblíqua, de reflexividade, contrariando a urgência da imagem realista que domina os media e que se esgota na produção ilusionista de um «real» continuamente produzido para ser recebido como. É essa, creio, a ideia que está na base do título: em vez de espelho, «por detrás». (…)”

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João Mota da Costa, Do outro lado do espelho, 2018

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CONVITE 1

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A série “Do outro lado do espelho”, de João Mota da Costa, encontra-se em exposição em Lisboa, no Pavilhão 31 do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, na Av. do Brasil, 53, de 15 Fevereiro a 30 Março de 2018 (2ª a 6ª feira das 10 às 16 horas; acesso automóvel pela entrada norte, Rua das Murtas).

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António Bracons, Aspetos da exposição, 2018

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