ARTHUR JÚLIO MACHADO E JOSÉ CANDIDO D’ASSUMPÇÃO E SOUZA, LISBOA UMA GRANDE SURPRESA (EXP), 2016
Uma grande surpresa! E que surpresa!
Descobrir a Lisboa do início do séc. XX (1898-1908), antes ainda da Implantação da República!

Encontramos nesta cerca de centena e meia de fotografias que se mostram no Arquivo Municipal de Lisboa – Fotográfico, aspetos detalhados da cidade: as ruas, as casas, também as pessoas, nas suas tarefas e trabalhos.
O texto da interessante folha de sala (abaixo), que nos presenteia com algumas das fotografias, identifica os dois fotógrafos: José Candido d’Assumpção e Souza (1856-1923) e Arthur Júlio Machado (1867-1947), desenhadores da Câmara Municipal de Lisboa, à data de início do projeto, com 42 e 31 anos, portanto, jovens e entusiasmados. Aguarda-se o catálogo, esperando poder conhecer um pouco mais da história destes dois fotógrafos.
Acredito que teriam a paixão pela fotografia, pois a exposição, mostrando uma seleção das suas provas, mostra imagens de enquadramentos cuidados, de detalhes atentos, da vivência da cidade e do seu espaço. Se este trabalho de fotografia – um levantamento ao longo de 10 anos, carregando câmara e tripé e tudo o mais – surgiu como um apoio ao seu trabalho de desenhador ou, antes, se o trabalho de desenhador foi um pretexto para realizar o trabalho fotográfico, desenvolver a paixão comum.


António Bracons, Aspetos da exposição
É mostrado também parte de um registo sistemático, em folhas mecanográficas, com provas coladas, um arquivo sistemático para o trabalho da área de urbanismo da Câmara.
Ressaltam outras questões: seriam os autores das fotografias os próprios impressores? Além das imagens da coleção do Município, teriam eles próprios a sua própria coleção, uma segunda impressão das imagens? Além deste trabalho, terão desenvolvido outros projetos pessoais?…
Os negativos em vidro e gelatina de prata estão no Arquivo, a partir dos quais foram efetuadas por contacto as provas em exposição (c. 17,9 x 12,9 cm), magnificamente impressas por José Luís Neto, a quem se deve também o excelente projeto expositivo.
Uma grande surpresa! – E quantas como esta! – Quantos espólios, uns conhecidos (identificados, depositados, conservados), outros mais ou menos estimados e guardados, por famílias ou empresas, registam cidades, vilas e aldeias, património e paisagem, vivências familiares, locais ou regionais, hábitos, costumes, tradições… Quantas imagens magníficas à espera de serem descobertas, cuidadas e dadas a conhecer.
António Bracons, Aspetos da exposição
Na segunda metade do séc. XIX a fotografia fixa e documenta a memória da cidade, através de vistas, ruas, praças e monumentos.
Cidades como Paris, Londres ou Berlim vão recorrer a vários fotógrafos para registar as alterações, construções, monumentos ou paisagens da malha urbana e Lisboa não é exceção.
O Fundo Antigo do Arquivo Municipal de Lisboa / Fotográfico, de que é representativa a exposição lisboa uma grande surpresa, documenta a memória da cidade, através de vistas, ruas, praças e monumentos ao longo de dez anos (1898-1908).
Os autores, anónimos durante cerca de um século apesar das diversas pesquisas realizadas, são atualmente conhecidos e apresentados nesta exposição. Trata-se de José Candido d’Assumpção e Souza (1856-1923) e de Arthur Júlio Machado (1867-1947), ambos desenhadores na Câmara Municipal de Lisboa, cuja proposta para fotografar os prédios da cidade foi encontrada num requerimento de 20 de Julho de 1898, no decurso de um trabalho de investigação, que permitiu aferir a autoria dos negativos e compreender o contexto de produção.
Às provas da época já existentes no Arquivo Fotográfico, veio juntar-se outro volumoso conjunto, proveniente do Museu de Lisboa, provas coladas em fichas mecanográficas, que associam as imagens à informação do local, ao nome do proprietário e ao valor matricial do prédio.
Há uma intenção clara de inventariar, mapear, cartografar e fotografar no levantamento prédio a prédio, assim como noutros registos a decorrer na cidade da época, discutidos e apoiados pela Câmara, acompanhando as tendências europeias de modernização da cidade.
Mas o foco da objetiva, não se fica pelo mapeamento urbano. Os vendedores, os transeuntes e as crianças acrescentam outras abordagens que trazem até nós uma cidade viva, onde se podem identificar as ruas, os monumentos e as praças, mas também os ofícios, o comércio, a cultura, a vivência da cidade.
Os próprios autores, muito contemporâneos nas várias valências e vertentes que assumiram ao longo da sua vida ativa e profissional, mostram-nos talvez por isso também, várias perspetivas e abordagens diferenciadas, partilhando com a cidade, o resultado da sua sensibilidade, associando-se a todos aqueles que se mobilizavam diariamente criando sinergias, para modernizar a cidade.”
Folha de sala
Arthur Júlio Machado e José Candido d’Assumpção e Souza, Lisboa uma grande surpresa (folha de sala)
A exposição “Lisboa Uma Grande Surpresa”, fotografias de Arthur Júlio Machado e José Candido D’Assumpção e Souza, abrangendo o período de 1898-1908, está patente no Arquivo Municipal de Lisboa – Fotográfico, na Rua da Palma, 246, de 23.09 a 31.12.2016.
Está anunciado o lançamento do catálogo no decorrer do período da exposição.
Sobre a história deste levantamento, há a referir:
a deliberação camarária de 13 de fevereiro de 1871, na qual se determina que a “Câmara mande photographar todos os edifícios antigos que seus proprietários pretendem demolir e possam inspirar qualquer interesse archeológico e bem assim todos os locaes que tenham de sofrer transformações importantes. Em Câmara, aos 13 de fevereiro de 1871 – Assignados Anselmo Ferreira Pinto Basto – Conde de Rio Maior, António – Dr. Joaquim José Alves – Dr Manuel Thomaz Lisboa. – Aprovada” 1
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Deliberação da Câmara Municipal de Lisboa de 13 de fevereiro de 1871.
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Desta deliberação resultou um conjunto de outras ações que conduziram à constituição do Arquivo Fotográfico Municipal. De facto, em 7 de outubro de 1898, José Cândido de Assumpção e Sousa e Artur Júlio Machado, desenhadores na recém criada Repartição de Obras da CML, submetem à Câmara Municipal de Lisboa um requerimento, onde propõem que sejam fotografados os prédios da cidade (…) produzindo, assim, um “levantamento, de carácter estatístico, que servisse, simultaneamente, de registo e complemento ao índice de prédios da capital existente nesta câmara”. 2
Esta proposta é aprovada em 22 de outubro desse ano, pelo arquiteto José Luís Monteiro, chefe da 1ª Repartição do Serviço de Obras, que considera o projeto de enorme valor para a cidade e até com um atraso de aproximadamente vinte anos, devendo por isso, no seu entender, serem fotografados todos os prédios, expropriados ou particulares, cuja demolição fosse eminente e que assim se aprovasse “nos termos das informações, não se excedendo as respectivas verbas orçamentais”. 3
Na semana seguinte, em 28 de outubro de 1898, Eduardo Freire de Oliveira, chefe do Serviço Central da 3ª Secção (archivo) ratifica este despacho no sentido da Câmara Municipal de Lisboa adquirir “um álbum do género” e finalmente a 24 de novembro desse ano, esta deliberação é aprovada expressando-se a intenção “(…) de se fazer assignatura dos elementos de estatística que largamente mencionam n’uma exposição junta ao seu requerimento, e nas condições ali exaradas” 4
O levantamento fotográfico realizou-se entre 1898 e 1912 pela firma Machado & Souza, dando-se assim continuidade a um registo, iniciado e não concluído, como mencionam os dois autores.
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1 Sessão de 25 de janeiro de 1871. Publicado em: Atas das Sessões da Câmara Municipal de Lisboa, 2ª série, nº 25, janeiro de 1871, p. 829.
2 AML, Requerimento de José Cândido de Assunção Sousa e Artur Machado propondo a Câmara Municipal de Lisboa fotografar os prédios da cidade, 1898, f. 1-6, PT/AMLSB/CMLSB/AGER-E/23/1763.
3 Sessão de 24 de novembro de 1898. Publicado em: Atas das Sessões da Câmara Municipal de Lisboa, p. 497.
4 Sessão de 24 de novembro de 1898. Publicado em: Atas das Sessões da Câmara Municipal de Lisboa, p. 497.
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Este texto faz parte de uma publicação do Arquivo Municipal de Lisboa | Fotográfico sobe a sua história. Pode ler o texto integral aqui.
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Atualizado em 2019.03.21
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