A CIDADE DENTRO DA CIDADE, FLÂNEUR EM LISBOA II, 2016
“Flâneur, New Urban Narratives”, é um projecto europeu coordenado a partir de Lisboa.
“Flâneur” é um projecto de arte no espaço público que tem por base a fotografia contemporânea, o território urbano e o trabalho em rede a nível internacional.
O projecto “Flâneur”, parte do conceito artístico desenvolvido por Baudelaire para apresentar, no espaço público, diversas instalações fotográficas inspiradas na literatura e no tecido urbano europeu. A ideia central do projecto é refletir criativamente sobre as dinâmicas urbanas da sociedade Europeia nos dias de hoje tendo como referência as vanguardas surgidas na viragem do século passado. Serão ainda realizadas residências artísticas, creative camps, publicações e conferências.
A Procur.arte é autora deste projecto que integra 14 entidades parceiras de 10 países europeus (Portugal, Alemanha, Itália, Reino Unido, Irlanda, Lituânia, França, Espanha, Polónia, Letónia).”
Depois de uma primeira apresentação em Portugal, em 2015, e após “16 meses de trabalho, um circuito europeu que incluiu residências artísticas e intervenções no espaço público em Londres, Paris, Hamburgo, Dublin, Lodz, Mansfield, Cortona, Riga, Kuldiga, Olot, o trabalho de 25 fotógrafos de 11 países, Flâneur – New Urban Narratives regressa a casa.”

Assim, em caixas de luz apresentaram-se no Jardim do Príncipe Real, em Lisboa, entre 25 de Agosto a 18 de Setembro os projetos “Et in Arcadia ego”, de Jens Masmann (Alemanha, 1968) e “The dice are thrown”, de Sonia Hamza (franco-marroquina, Paris, 1975), na sequência de duas residências artísticas realizadas em junho; a curadoria é de Nuno Salgado.
As fotografias de Jens Masmann, a cor, veem a cidade construída, por vezes habitada; as imagens são sobrepostas sem que se fundam, funcionando a base como uma “moldura” ou complemento, frequente vezes – quando a visão o permite – apresentada em direção oposta à principal ou central.
Sonia Hamza fotografa regra geral com negros intensos, muito contrastados, espaços amplos ou pormenores da cidade, frequentemente como padrões, ainda que com alguma dissonância ou humor.
Passeio entre as caixas e as imagens colocadas no pavimento, num passeio alteado, onde se encontram as fotografias, textos e imagens da presença do “flaneur” noutras cidades. É dia. O sol brilha e está quente, as luzes das caixas acendem-se à noite. Estão, pois, apagadas. Os reflexos do jardim e da envolvente nalgumas das imagens, permite uma outra leitura das obras.

Referem os autores sobre os seus projetos:
Jens Masmann / “Et In Arcadia Ego”
Os sonhos de ontem sobre o amanhã são a realidade do presente.
O futuro parecia brilhante, pelo menos melhor do que o passado.O Paraíso pode ser visto como o último futuro desejado. As utopias urbanas são uma tentativa de aproximação da sociedade a esse último futuro.
Devem ser implementadas pela construção de estruturas e padrões. Essas estruturas e padrões são materiais e físicos, mas também intelectuais e conceptuais. Não são, no entanto, aceites pela grande maioria das pessoas. A questão interessante é se a sua interacção é criativa ou é destrutiva.Porque na sua relação com um ambiente, as pessoas podem ou reinventar ou destruir estruturas urbanas mais antigas.
Na segunda metade do séc. XX, cada uma das décadas modelou Lisboa de um modo diferente, desde o princípio da década de 60 quando a arquitectura delicadamente apresentou o desenho de uma sociedade moderna, passando pelos anos 80, quando o paraíso consumista do kitsch atingiu a cidade, até à década de 90 quando a Expo 98 introduziu uma espécie de cosmopolitismo “cool”.
Lisboa é uma cidade de densidade utuante: Áreas de grande densidade seguidas de espaços vazios e esquecidos, locais onde a cidade se funde na abstracção. No entanto, aparentemente, os habitantes aceitam esses vazios que servem como uma espécie de amortecedor entre os diferentes esquemas urbanos. Por vezes são usados de um modo informal, outras vezes encarados apenas como zonas de vazio.Ao caminhar pelas ruas de Lisboa, sondei, com a minha câmara, marcas de décadas passadas tentando perceber o que aconteceu no percurso entre a utopia e a realidade.
Após conhecer a Sonia e o seu trabalho inspirador – igualmente centrado em padrões e estruturas mas a uma escala diferente – tornou-se claro que a possibilidade de combinar os dois conceitos poderia completar o trabalho de cada um. E foi isso que aconteceu.”
Sonia Hamza / “The Dice Are Thrown”
Para mim visitar uma cidade pela primeira vez é como ler um romance. Preciso de me familiarizar com as personagens e com o cenário. Detesto saber algo sobre um lugar sem eu própria o ter experimentado antes. Sou uma jogadora.
Tento abrir todos os sentidos para perceber a Cidade e os seus habitantes. A minha atenção é atraída pelos detalhes. É como se eu não conseguisse perceber o todo sem antes analisar os pedaços um por um. O que, no nal produz uma entidade própria, como se fosse um lugar completamente diferente real ou imaginário. Adoro transformar as pessoas no meu mundo paralelo. Similar mas diferente. Realidade distorcida. Uma espécie de Alice in Wonderland, acho eu.Lisboa foi uma maravilhosa anfitriã. Ofereceu-me toda a sua poesia, através das suas cores, das suas texturas, das suas gentes. Todo o esforço — físico, devido à sua particular geografia mas também intelectual, devido à comunicação e à compreensão dos modos de vivência – para descobrir os seus tesouros fez-me sentir especial e foi compensatório, quando a colheita era boa e eu conseguia uma imagem mágica. Como uma prova.
Todas as noites, eu e o Jens contávamos um ao outro sobre os tesouros descobertos durante o dia. Por isso, um trabalho solitário tornou-se um jogo que nos fez misturar as nossas duas visões.
Foi extremamente interessante perceber como duas técnicas tão diferentes, duas abordagens tão diversas ao tema da Cidade poderiam ser “misturadas”, introduzindo a cada um dos trabalhos uma nova dimensão.O próximo passo foi jogar com os cubos do conceito expositivo do projecto Flâneur.
As últimas personagens da experiência serão os visitantes da exposição. Esperamos conseguir partilhar o prazer de ter feito parte de Lisboa durante algum tempo.”
António Bracons, Flâneur em Lisboa, Jardim do Príncipe Real, Lisboa (Aspetos da exposição), 2016
Integrado no evento, teve lugar a 10 de setembro no Carpe Diem – Arte e Pesquisa, na próxima Rua do Século, um ciclo de conferências e debates.
Para conhecer mais sobre o projeto Flâneur, ver aqui.
Para conhecer melhor Jens Masmann, ver aqui.
Para conhecer melhor Sonia Hamza, ver aqui.
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