DANIEL BLAUFUKS, RIO. HOJE É SEMPRE ONTEM – UM CERTO RIO DE JANEIRO, 2013

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Daniel Blaufuks

RIO. Hoje é sempre ontem – Um certo Rio de Janeiro

Fotografia e texto: Daniel Blaufuks

Lisboa: Tinta da China Edições; Rio de Janeiro, Brasil: Tinta da China Brasil / Julho . 2013

Português e inglês / 19,6 x 24,9 cm / não paginado

Cartonado com sobrecapa / Integra o livro um postal com uma das fotografias (‘toalha amarela’) e reprodução de 3 recortes: «anúncio “Mãe Vitória”», talão do “Amarelinho – mesa n.º, Garçon 7, N.º 18887” e mapa do Brasil.

ISBN: 9789896711672 (P), 9788565500081 (Brasil)

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Daniel_Blaufuks-Rio (1)

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“Dar sentido ao que se vive

Mesmo que o espaço flerte com o absurdo

Aprender a construir a dor

Mesmo que o sarcasmo engula o movimento

Apagar as centelhas do coração

Para transformar minha carne em pedra

Rir da moral acorrentada e contrita

Para acreditar apenas na ilegitimidade absoluta do mundo

E na derrocada definitiva do mito humano.”

                                                                                                              Célestin Monga

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Tudo no Rio de Janeiro parece simples. A vida é uma longa sucessão de momentos agradáveis e de experiências maravilhosas. Um suco de açaí, um passeio pela floresta da Tijuca, uma picanha na Gávea, uma tarde de praia em Ipanema, um pôr-do-sol no Arpoador, e o dia ainda mal começou.”

Daniel Blaufuks, “Hoje é sempre ontem”

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Blaufuks  vive no Rio a exuberância da natureza, através do detalhe dos frutos e das flores, a densidade da cidade e das pessoas no detalhe e na amplitude da paisagem urbana e das gentes. E nas imagens de memórias. Por vezes, imagens isoladas, de uma página ou de todo o fólio, noutras em dípticos.

O Rio de Blaufuks, mais que uma vivência, é um sentimento.

De um europeu, ou português, que encontra um certo Rio de Janeiro.

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“Hoje é sempre ontem” esteve em exposição, em projeção dupla intermitente, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 2011. Sobre ela escreveu Luiz Camillo Osorio:

“Hoje é sempre ontem”, título desta exposição do artista português Daniel Blaufuks, aparece escrito em um pequeno trabalho de Wesley Duke Lee pertencente à coleção Gilberto Chateaubriand exposta no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Esta frase está escrita sobre uma antiga fotografia colada junto a uma referencia da bandeira brasileira. O país do futuro surge tingido por uma suave melancolia. Os principais clichês de um Brasil tropical, alegre e exuberante por natureza, sem deixarem de ter sua relevância, escondem, sob o fino véu da malandragem, uma insegurança existencial e civilizatória. A pujança de uma terra onde plantando tudo nasce é tensionada cotidianamente por uma sociabilidade que consome o outro no pathos da proximidade total.

Em uma breve correspondência por email acerca desta exposição, Blaufuks comentou: “são fotogramas de um filme que é o meu embate com a paisagem do Rio de Janeiro. Esta é linda, podre, tropical, melancólica, erótica, decadente entre muitas outras definições possíveis. É, claro, a visão de um europeu.” Este conjunto de imagens revelam a tensão, constantemente vivida por nós cariocas, entre intensidade e decadência. O olhar do estrangeiro, assim como o da criança e do convalescente, se deixa admirar pelas surpresas do que se mostra pela primeira vez, sem a anestesia dos hábitos e da repetição. Não é de hoje que o Brasil conta com o olhar de fora para perceber melhor suas singularidades, no que elas têm de potente e inadequado. Os vícios de uma história colonizada misturam-se ao desejo de ser outro, de não saber-se o que se é, de um país que se vê sempre prensado entre o não ser e o ser de todas as maneiras.

Nessa seqüência de imagens/paisagens somos surpreendidos por uma temporalidade, quiçá uma luminosidade, onde se irmanam serenidade e desencanto. A pobreza não é nunca miserável, as ruínas se insinuam pelos cantos das salas, a confusão urbana aparece contida e explosiva, as fisionomias são mais graves que alegres (coisa estranha numa cidade que gosta tanto de se ver rindo), as flores e frutas condensam uma sensualidade que não está nas praias, que são mais místicas do que físicas.

A câmera que circula pela cidade traduz a experiência do fotógrafo exigente misturada à surpresa do viajante disponível. Por um lado, uma enorme atenção à dimensão formal da imagem: o enquadramento, a luz, as texturas, os contrastes, a edição, tudo ali é resultado de um olhar que faz escolhas precisas. Por outro, é como se escapasse uma viscosidade própria a uma realidade estranha, ao mesmo tempo familiar e inusitada, dando a algumas fotografias um cheiro acridoce, curtido pelo tempo desacelerado da umidade, da maresia e do descaso das esquinas cariocas.

Em um dos fotogramas apresentados, lemos uma frase de Carlos Drummond de Andrade; “viajar em fotografias / sentir-se imagem flutuando entre imagens”. Do retrato tradicional do pai que posa segurando o bebê, às apropriações de fotos antigas, tudo se faz imagem e produz no espectador a sensação do seu próprio devir-imagem, a sua multiplicação assustadora nos registros digitais. O que interessa neste conjunto/fluxo é o efeito das justaposições, as singularidades que se apresentam através das relações entre os fotogramas, cruzando vários tempos e sensações em um agora plural, “dando sentido ao que se vive, mesmo que o espaço flerte com o absurdo”.

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Daniel Blaufuks, Rio. Hoje é sempre ontem – Um certo Rio de Janeiro, 2013

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